sábado, 14 de abril de 2007

300 - A ode ao fascismo de Frank Miller

comic_tub1.jpg A obra 300 de Frank Miller ganhou há pouco, grande exposição na mídia graças a sua adaptação cinematográfica. Conseqüentemente, muito tem se falado a respeito do aspecto político do filme. A pergunta rasa e primária que qualquer bom jornalista de programa dominical deve fazer é: “Quem representa George W. Bush na trama? Leônidas ou Xerxes?”. A verdade é que a ideologia embutida na hq de Miller vai muito além do cenário atual e representa diretamente as crenças do autor a respeito de política e religião.

Por mais que não diga isso abertamente, Frank Miller agregou, durante anos às histórias em quadrinhos de super-heróis questões de cunho político, ideológico e religioso. Seja em suas primeiras incursões na revista do Demolidor, ou em sua obra definitiva, Sin City, Miller deixa claro em todos os seus trabalhos um grande desprezo por instituições como governo e igreja. Esse tipo de desapego a normas e entidades reguladoras pode parecer, à primeira vista, uma simples rebeldia, uma forma de transgredir os valores da sociedade, coisa que os mestres como Miller fazem como ninguém.

Alguns poderiam baseados nas alegações acima, chamar Miller de anarquista, mas estariam cometendo um grande engano. O autor não defende ideais anárquicos (que, na etimologia da palavra grega, significa ausência de governador) mas sim uma forma, algumas vezes sutil e outras nem tanto, de nacionalismo exagerado. Também conhecido como fascismo.
Segundo a enciclopédia amiga de todas as horas, a Wikipédia, o fascismo é: coletivista, procura mobilizar as massas com propaganda vulgar e violência escandalosa (Opinião do editor). Se opõe ao liberalismo clássico e o conservadorismo. O líder fascista é um ator exagerado, no qual são depositadas todas as esperanças de forma messiânica. O fascismo surge em tempos de grande stress, quando a fórmula democrática moderna falha. Aqueles que desejam promover o sectarismo são o sustentáculo fascista.

Qualquer semelhança com o rei espartano Leônidas, não é mera coincidência. O líder bélico de Esparta em nenhum momento deixa dúvidas a respeito da superioridade de sua cidade-estado sobre o resto do mundo, bem como de seu desprezo aos líderes religiosos. A guerra é a marca registrada e a profissão desse povo, que se especializou em defender seu território, visto por conquistadores asiáticos como porta de entrada para a Europa.

comic_tub2.jpg Uma seqüência é marcante no segundo dos cinco volumes da mini-série, quando Leônidas visita os éforos. Estes “homens” são os sacerdotes de Esparta, os guardiões dos antigos deuses, e mesmo decisões primordiais para o destino do país devem passar pelo crivo destes anciões. Miller retrata estes religiosos como criaturas grotescas, mundanas e totalmente corruptas. Em poucas páginas, o autor destila seu veneno sobre as instituições religiosas, que maquiam-se de santidade para obter benefícios bastante questionáveis, como dinheiro, status e sexo. É impossível não pensar que esta é a visão que Miller tem da religião organizada: um bando de homens sujos e imprestáveis que se aproveitam da fé alheia para tornar suas vidas cheias de riqueza e luxúria. A caracterização deformada dos personagens reflete a podridão interior das organizações religiosas, principalmente a igreja católica que, quando não promoveu, foi conivente com muitas guerras, a fim de perpetuar seu poder junto às massas.

comic_tub3.jpg O Rei-Deus Xerxes também pode ser encarado como uma representação da igreja, que submete “escravos” para aumentar seus domínios e seu poder. O domínio do mundo é o objetivo deste “Deus”, que na verdade não passa de um homem megalomaníaco, coberto de ouro e soberba. É difícil não notar aqui, uma nova crítica ao vaticano, com seus ornamentos dourados, que têm por objetivo justamente mostrar ao homem sua insignificância diante de tanta grandeza.

O objetivo de Leônidas em sua campanha suicida nada mais é do que mostrar aos persas que seu líder, auto-proclamado Deus, pode sangrar. Ao jogar sua derradeira lança, o rei espartano não mata mas consegue, com seu sacrifício, mostrar a todos que o divino não existe. Apenas o poder do homem, a força de vontade, a união do povo, a força do conjunto, representada pelo exército impenetrável e a organização militar espartana, é capaz de alcançar grandes objetivos.

A presença de um grande líder que é capaz de sacrificar tudo por sua nação e por seu povo, o Estado que é mais importante do que tudo e a morte da religião, pois esta nada mais faz do que enfraquecer o povo são os principais pontos que Miller nos apresenta, e que representam, claramente, ideais fascistas. E não é a primeira vez que o escritor traz à tona este tipo de visão política. Em Batman – O Cavaleiro das Trevas, o autor mostra o homem-morcego como o líder político de uma revolução que tem por objetivo derrubar uma fachada de liberdade em um país totalitarista, os Estados Unidos de um futuro próximo. Assim como o rei espartano, Batman trata seus soldados como “crianças”, mas em nenhum momento se arrepende de usá-los para alcançar aquilo que julga ser um objetivo maior: a liberdade. Quando nos mostra a derradeira luta entre Superman e Batman, Miller novamente nos confronta com o embate entre o homem e o divino. O kryptoniano, tratado como um deus entre os homens, acaba levando uma surra do mortal vestido de morcego, que utiliza apenas inteligência, táticas de guerrilha e, claro, um pouco de kryptonita. comic_tub4.jpg

O “líder fascista” de Frank Miller, seja ele Batman ou Leônidas não mata os falsos deuses, mas os utiliza como exemplo, provando que são tão humanos quanto eu e você, cheios de defeitos e imperfeições. Ao contrário disto, eles mesmos se colocam em sacrifício, tornando-se assim mártires e provando a seu povo que qualquer esforço é válido quando o que está em jogo é a integridade da nação.

Do início ao fim, 300 nos traz uma história de honra e glória, mas principalmente de quebra de valores. Somos apresentados a uma sociedade guerreira, praticamente primitiva, mas que mantém sua conduta e seus ideais inabaláveis, apesar de serem cercados por instituições falidas e inescrupulosas. Por outro lado, os persas, considerados um povo à frente de seu tempo, demonstram submissão diante de um poder religioso que os torna medíocres. Os espartanos, ao ignorar seus sacerdotes e seguir uma orientação de retidão e valorização de seus ideais merecem, no mínimo, nosso respeito. Miller nos mostra em 300 que a grande força da humanidade não se encontra na religião e sim no povo, que os espartanos aprendiam a defender com a própria vida, durante anos de árduo treinamento.

comic_tub5.jpg Particularmente me irrita um pouco notar que somos, hoje em dia, muito mais persas do que espartanos. Nos devotamos a “deuses” pré-fabricados pela mídia, nos deixamos escravizar por sistemas de idéias que nos são vendidos de forma pasteurizada, mas pouco nos importamos com aqueles que estão a nosso lado, na linha de frente. É hora de levantar nossos escudos contra os discursos prontos que provém de nossos meios de comunicação. Da coxa ao pescoço, mas não descuidando da cabeça.



Um abraço!
Marton Santos

Link download - 300

Link download - Cavaleiro das Trevas
Senha: reverso
Créditos: Rapadura Açucarada


Este texto de Marton Santos eu tirei do blog Sedentário & Hiperativo, achei MUITO bom e decidi colocar aqui também para todos

Um comentário:

MagnaMinikowski disse...

O texto é teu?
Eu não gostei não velho, descordo de muito, e inclusive, acho um lixo a série onde Batman luta contra o Super-homen, visto que, foje ao real ideal de ambos, primeiro, batman não derrota o superhomen com inteligência, derrota com criptonita e traição, e nem bem derrota, poi deopis acaba levando a surra que tanto mereceu, pois é um babaca na série!
Bem, sobre sermos mais persas que espartanos, bem, os espartanos acreditavam muito mais nos deuses que os persas, tanto que, nenhum dos 10 000 espartanos do exercito se mexeu por culpa dos Deuses deles...
Bem, não é uma questão de falsos deuses, Xerxes, era um cara com poder, que NUCA se tratou como falso-deus, apenas nessa HQ, alias, ele propos por muito tempo uma rendição pacífica à esparta, e Leônidas respondia com chingamentos, E bem, super-homen, não é um falso Deus, bem, ele eh um humano, e nos, formigas!